Brooke Foss Westcott (1825-1901) e Fenton John Anthony Hort (1828–1892)
“Quem subirá ao monte do Senhor, ou quem estará no seu lugar santo? Aquele que é limpo de mãos e puro de coração, que não entrega a sua alma à vaidade, nem jura enganosamente.” (Salmo 24:3-4 | ACF)
Suas vidas e Obra
Brooke Foss Westcott (1825-1901) e Fenton John Anthony Hort (1828–1892) foram dois renomados estudiosos anglicanos da Universidade de Cambridge. Eles eram conhecidos por serem os principais arquitetos da teoria crítica que resultou no Testamento Grego revisado que substituiu o Textus Receptus (TR) ou Texto Recebido. Aos 23 anos, no final de 1851, Hort escreveu a um amigo:
“Até as últimas semanas, eu não tinha ideia da importância dos textos, tendo lido tão pouco o Testamento Grego e me arrastado com o vil Textus Receptus […]. Ao pensar naquele vil Textus Receptus apoiando-se inteiramente em MSS tardios; é uma bênção que haja aqueles tão antigos.”
Este preconceito inicial contra o TR deu início à cruzada de Hort contra ele, ao longo da vida, e aos esforços para vê-lo substituído pelo Codex Vaticanus e pelo Codex Sinaiticus. Pouco mais de um ano depois, o plano de uma revisão conjunta do texto do Testamento grego foi acordado pela primeira vez com Westcott.
Em 1857, cinco clérigos anglicanos iniciaram esforços para garantir uma revisão da Bíblia inglesa. Conscientes disso, Westcott e Hort trabalharam juntos no texto grego durante vinte anos, preparando-se para o dia em que seriam nomeados para participar do comitê de revisão do Novo Testamento. Eles também inventaram uma teoria imaginária (de 150 páginas) que seria suficientemente precisa para convencer outros a favorecer uma mudança no texto grego. As falsas suposições são estas:
Eles presumiram que entre 250 d.C. e 350 d.C. houve uma revisão do texto grego que produziu o texto majoritário. Os manuscritos discordantes foram misturados para formar este texto e, assim, muitos versículos e passagens adicionais foram acrescentados.
Dizem que esta revisão causou a perda do texto original (até que os códices do Vaticano e do Sinai foram encontrados).
Dizem que esta foi uma conspiração de toda a Igreja Ortodoxa que suprimiu com sucesso o original até os dias de hoje, inclusive.
Estes são os argumentos-padrão contra o texto da Versão Autorizada da Bíblia, a King James (KJV). Eles não são justos. Nem honestos. Eles não tratam da realidade dos fatos do caso, que mostram que os manuscritos anteriores eram provavelmente de um texto mutilado produzido pela seita herética chamada de adocionistas (uma forma de gnosticismo) no final do século II d.C. (descrita na História da Igreja de Eusébio). As igrejas ortodoxas reconheceram estes textos mais curtos como falsos e não os utilizaram. Eles continuaram a preservar e fazer cópias do texto verdadeiro (que é o Texto Majoritário).
Em 1870, a Igreja da Inglaterra finalmente aprovou uma resolução para revisar a Bíblia em inglês. O comitê de revisão do Novo Testamento por fim foi constituído por 25 estudiosos (embora apenas cerca de 16 eventualmente tenham comparecido às reuniões), que incluíam Westcott e Hort. A comissão trabalhou durante dez anos na Câmara de Jerusalém, e estes dois estudiosos levaram consigo a Comissão de Revisão após o início dos trabalhos. Na verdade, o “trio de Cambridge” (Westcott, Hort e Lightfoot) conspirou com outros para dominar as reuniões com as suas opiniões sobre o texto e para derrotar qualquer um que se lhes opusesse. Suas cartas revelam esta conspiração:
Westcott escreveu a Hort em 29 de maio de 1870:
Sua nota veio com uma de Ellicott esta manhã […]. Embora eu pense que a convocação não é competente para iniciar tal medida, sinto que, como ‘nós três’ estamos juntos, seria errado não ‘tirar o melhor proveito dela’, como diz Lightfoot […]. Há alguma esperança de que as leituras alternativas possam encontrar um lugar na margem.[1]
Westcott escreveu a Lightfoot, em 4 de junho de 1870:
“Não deveríamos realizar uma conferência antes da primeira reunião para revisão? Há muitos pontos sobre os quais é importante que estejamos de acordo.”[2]
Hort escreveu a Williams:
“Os erros e preconceitos, que concordamos em desejar remover, podem certamente ser alcançados de forma mais saudável, e, também mais eficaz, por esforços individuais de tipo indireto do que pelo ataque aberto e combinado. Atualmente, muitos homens ortodoxos, mas racionais, estão a ser inadvertidamente influenciados por influências que certamente darão bons frutos no devido tempo, se for permitido que o processo prossiga silenciosamente; e não posso deixar de temer que uma crise prematura assuste muitos de volta ao mero tradicionalismo.”[3]
A única voz que defendeu o Textus Receptus foi o Dr. Frederick Henry Ambrose Scrivener, à época era provavelmente o principal estudioso dos manuscritos do Novo Testamento grego e da história do Texto. Mas ele foi sistematicamente derrotado pelo trio de Cambridge e vencido pela poderosa habilidade que Hort possuía em debates. Quando a revisão foi concluída, eles alteraram o Texto Grego em 5.337 (cinco mil trezentos e trinta e sete) lugares, violando assim a regra original que havia sido estabelecida para a comissão de não alterar o Texto Grego, a menos que fosse absolutamente necessário fazê-lo.
Hoje, mesmo os críticos naturalistas chegaram à conclusão de que a teoria crítica de Westcott e Hort é errônea em todos os pontos. Eldon Jay Epp confessa que “simplesmente não temos uma teoria do texto”. K. W. Clark fala o seguinte sobre o texto de Westcott e Hort:
“A história textual postulada para o Textus Receptus em que agora confiamos explodiu”.
E diz ainda:
“A história textual que o texto de Westcott-Hort representa não é mais sustentável à luz de descobertas mais recentes e de uma análise textual mais completa. No esforço para construir uma história congruente, o nosso fracasso sugere que perdemos o caminho, que chegamos a um beco sem saída e que apenas uma visão nova e diferente nos permitirá avançar.”
As crenças deles
De acordo com D. A. Waite, Westcott e Hort negaram certas doutrinas fundamentais da fé cristã (ver D. A. Waite, Heresies of Westcott and Hort [As Heresias de Westcott e Hort] (Collingswood: The Bible for Today, 1979). Os dois estudiosos tinham visões modernistas.
Hort acreditava claramente na nova teoria da evolução. Ele escreveu ao reverendo John Ellerton, em 3 de abril de 1860:
“Mas o livro que mais me envolveu foi Darwin. Independentemente do que se pense a seu respeito, é um livro do qual nos orgulhamos de ser contemporâneos […]. Minha sensação é forte de que a teoria é irrespondível. Se assim for, abre-se um novo período.”[4]
Westcott não acreditava na interpretação literal do relato da criação em Gênesis. Westcott escreveu ao Arcebispo de Cantuária sobre a crítica do Antigo Testamento, em 4 de março de 1890:
“Suponho que agora ninguém sustenta que os três primeiros capítulos de Gênesis, por exemplo, fornecem uma história literal – eu jamais conseguiria entender como alguém que os lê com os olhos abertos poderiam pensar que sim.”[5]
Tanto Westcott quanto Hort eram a favor da adoração a Maria. Ambos foram fortemente influenciados pelo “Movimento de Oxford” do Cardeal Newman. O Cardeal Newman, a quem eles admiravam muito, era um alto clérigo que conduziu muitos de volta à Igreja Católica Romana. De acordo com Benjamin Wilkerson:
“No ano de 1870, a influência do Movimento de Oxford tornou-se tão poderosa que um preconceito teológico a favor de Roma estava afetando homens de autoridade elevada. Muitas das instituições mais sagradas da Inglaterra protestante foram atacadas e algumas delas foram completamente alteradas. O ataque aos Trinta e Nove Artigos pelo Tratado 90 e a subversão das doutrinas protestantes fundamentais dentro da Igreja da Inglaterra foram tão ousadas e completas que uma tentativa de substituí-la por uma versão que desacreditasse teológica e legalmente a nossa versão protestante comum não seria uma surpresa.”
Westcott e Hort, em suas próprias palavras, confessaram abertamente sua adoração a Maria. Westcott escreveu da França para sua noiva, em 1847:
"Depois de deixar o mosteiro, seguimos rumo a um pequeno oratório que descobrimos no cume de uma colina vizinha […]. Felizmente encontramos a porta aberta. É muito pequeno, com um lugar para ajoelhar; e atrás de uma tela havia uma ‘Piéta’ de tamanho real (ou seja, uma Virgem e Cristo morto) […]. Se eu estivesse sozinho, poderia ter ficado ajoelhado ali por horas.”[6]
Westcott escreveu ao Arcebispo Benson, em 17 de novembro de 1865:
“Eu gostaria de poder enxergar qual a verdade esquecida que a mariolatria presta testemunho.”[7]
Hort escreveu a Westcott:
“Estou muito longe de fingir que compreendo completamente a vitalidade frequentemente renovada da Mariolatria.”[8]
Hort escreveu a Westcott, em 17 de outubro de 1865:
“Há muitos anos estou convencido de que a adoração a Maria e a adoração a ‘Jesus’ têm muito em comum em suas causas e resultados.”[9]
Suas crenças e práticas secretas
Embora a integridade do trabalho de Gail Riplinger, New Age Bible Versions [Versões Bíblicas da Nova Era] (Ohio: AV Publications, 1993), tenha sido questionada com acusações de que ela inventou muitas informações ou as obteve de fontes não confiáveis, pode valer a pena mencionar suas descobertas, baseado nas biografias de Westcott e Hort escritas por seus filhos, que:
Quando estudante de graduação em Cambridge, Westcott organizou um clube que chamou de Hermes, um guia mitológico de almas que partiram para o Hades. Este clube reuniu-se de 1845 a 1848 e foi evidentemente um precursor do Ghost Club [Clube Fantasma].
Westcott e Hort estavam entre os fundadores do Ghost Club (ou “Bogie Club” [Clube do Bicho-Papão], como os escarnecedores o chamavam) em 1850, com o propósito de investigar “fantasmas e todas os aparecimentos de efeitos sobrenaturais, estando dispostos a acreditar que tais coisas realmente existem”. Tais práticas são condenadas nas Escrituras em Deuteronômio 18:11.[10]
Ambos eram amigos de Charles Darwin, Sigmund Freud e Carl Jung, que eram inimigos da causa de Cristo.
Seus frutos
Alguns alegaram que o histórico de Westcott e Hort é totalmente irrelevante para a questão relativa às versões modernas como a Nova Versão Internacional (NVI). Mas esta afirmação é falsa. Trazer à tona seus antecedentes não é um mero argumento ad hominem. Se Westcott e Hort não tivessem sido o tipo de homens que foram, porém, tivessem sido estudiosos verdadeiros, regenerados, tementes a Deus e crentes na Bíblia, como o Dr. Scrivener, quão diferente o Novo Testamento da Versão Revisada (RV) teria sido. Não teria havido nenhuma teoria crítica inventada para convencer o comitê a rejeitar o Textus Receptus. Não teria havido pressão para remover porções das Escrituras que não são encontradas nos “primitivos manuscritos”. Na verdade, a RV poderia ter sido uma melhoria em relação à KJV se o seu texto não tivesse sido alterado, e as traduções modernas hoje teriam sido baseadas no texto Majoritário. A formação dos dois estudiosos de Cambridge fez, portanto, uma diferença muito importante na história recente da Bíblia inglesa.
As informações prévias sobre as vidas e crenças dos dois homens demonstraram que eles dificilmente foram objetivos na sua rejeição preconceituosa do Textus Receptus, mas foram profundamente preconceituosos contra ele pela sua teologia liberal, postura anti-protestante e anti-evangélica, e por sua visão inferiorizada das Escrituras. No entanto, as instituições e os seminários continuaram a aceitar e a utilizar os seus pontos de vista e ditames como se fossem julgamentos totalmente objetivos e imparciais de críticos textuais especializados, mesmo quando os críticos naturalistas posteriores apontaram o quão errados eles estavam.
Além disso, o espírito apóstata que motivou Westcott e Hort, como visto na sua alegada desobediência à Lei de Deus que proíbe a necromancia e o espiritismo, na sua rejeição persistente das doutrinas fundamentais e na sua elevação da erudição humanística acima da autoridade da Palavra de Deus, torna-os muito perigosos para a Igreja. Eles nunca deveriam ter sido autorizados a aproximar-se das preciosas Escrituras com seus bisturis editoriais. Ao adulterar o próprio sustento que o rebanho necessita para sobreviver, eles infligiram muitos danos à igreja nas gerações por vir. Eles entraram como lobos ferozes, não poupando o rebanho (Atos 20:29).
Depois que Westcott e Hort publicaram seu Novo Testamento Grego revisado, as únicas outras edições impressas disponíveis do texto grego são o Novo Testamento Grego da Sociedade Bíblica Unida (UBSGNT) e o Novo Testamento Grego de Nestle. Ambos são derivados do texto de Westcott e Hort. Embora as edições posteriores afirmem ser ecléticas, os vestígios de Westcott e Hort permanecem. Por exemplo, as edições da UBSGNT persistem em questionar a autenticidade dos últimos 12 versículos de Marcos (Marcos 16:9-20), da passagem sobre a mulher apanhada em adultério (João 7:53-8:11) e da comma joanina (1 João 5:7-8), seguindo Westcott e Hort.
O Novo Testamento de todas as traduções modernas para o inglês, são baseadas nessas edições do Novo Testamento grego. Além disso, os tradutores da Bíblia em todo o mundo estão usando estes Novos Testamentos gregos para o seu trabalho de tradução. Todos estes, portanto, carregam até certo ponto o legado inconfundível de Westcott e Hort. Assim, os danos causados por eles foram muito extensos.
Conclusão
Concluindo, deve-se dizer que não importa quão boa seja qualquer versão moderna do Novo Testamento em outros aspectos, ela ficará claramente manchada se o trabalho de Westcott e Hort estiver presente nela. A presença do seu trabalho significa que este se baseia num texto defeituoso. Aqueles que querem honrar a Palavra de Deus não devem promover o uso de qualquer uma dessas versões pela igreja, não porque o conteúdo da versão seja mau em si, mas porque a atitude de se contentar em usar uma versão manchada em vez de existir uma sem mácula, desonra a Deus. Se Deus se deu ao trabalho de preservar para o Seu povo um bom texto grego do Novo Testamento durante dezoito séculos, quão desonroso seria para Ele se o Seu povo agora escolhesse mudar para uma versão baseada num texto defeituoso.
Deixe a história bíblica de Nadabe e Abiú servir de lição para todos:
“E os filhos de Arão, Nadabe e Abiú, tomaram cada um o seu incensário e puseram neles fogo, e colocaram incenso sobre ele, e ofereceram fogo estranho perante o Senhor, o que não lhes ordenara. Então saiu fogo de diante do Senhor e os consumiu; e morreram perante o Senhor. E disse Moisés a Arão: Isto é o que o Senhor falou, dizendo: Serei santificado naqueles que se chegarem a mim, e serei glorificado diante de todo o povo. Porém Arão calou-se. E Moisés chamou a Misael e a Elzafã, filhos de Uziel, tio de Arão, e disse-lhes: Chegai, levai a vossos irmãos de diante do santuário, para fora do arraial. Então chegaram, e os levaram nas suas túnicas para fora do arraial, como Moisés lhes dissera. E Moisés disse a Arão, e a seus filhos Eleazar e Itamar: Não descobrireis as vossas cabeças, nem rasgareis vossas vestes, para que não morrais, nem venha grande indignação sobre toda a congregação; mas vossos irmãos, toda a casa de Israel, lamentem este incêndio que o Senhor acendeu.” (Levítico 10:1-6 | ACF)
Por Charles Seet
Publicado em The Burning Bush (jan. 1998. vol. 4. Nº 1). Disponível em https://www.febc.edu.sg/v15/article/def_the_inside_story_of_westcott_and_hort. Traduzido em português por Ícaro Alencar de Oliveira, Rio Branco, Acre, Brasil – 09 de novembro de 2023.
Fonte do artigo traduzido em português: https://anabatistas.com/2023/11/09/por-dentro-da-historia-de-westcott-e-hort/#d6a7ec81-7f28-422f-9b52-1ebcdc702883-link.
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NOTAS
1. WESTCOTT, Arthur. Life and letters of Brooke Foss Westcott [Vida e cartas de Brooke Foss Westcott]. Londres: MacMillan, 1903. vol. 1. p. 290.
2. WESTCOTT, Arthur. Life and letters of Brooke Foss Westcott [Vida e cartas de Brooke Foss Westcott]. Londres: MacMillan, 1903. vol. 1. p. 391.
3. HORT, Arthur. Life and Letters of Fenton John Anthony Hort [Vida e Cartas de Fenton John Athony Hort]. Londres: McMilan, 1896. vol. 1. P. 400.
4. HORT, Arthur. Life and Letters of Fenton John Anthony Hort [Vida e Cartas de Fenton John Athony Hort]. Londres: McMilan, 1896. vol. 1. p. 416.
5. WESTCOTT, Arthur. Life and letters of Brooke Foss Westcott [Vida e cartas de Brooke Foss Westcott]. Londres: MacMillan, 1903. vol. 2. p. 69.
6. WESTCOTT, Arthur. Life and letters of Brooke Foss Westcott [Vida e cartas de Brooke Foss Westcott]. Londres: MacMillan, 1903. vol. 1. p. 81.
7. WESTCOTT, Arthur. Life and letters of Brooke Foss Westcott [Vida e cartas de Brooke Foss Westcott]. Londres: MacMillan, 1903. vol. 1. p. 251.
8. HORT, Arthur. Life and Letters of Fenton John Anthony Hort [Vida e Cartas de Fenton John Athony Hort]. Londres: McMilan, 1896. vol. 2. p. 49.
9. HORT, Arthur. Life and Letters of Fenton John Anthony Hort [Vida e Cartas de Fenton John Athony Hort]. Londres: McMilan, 1896. vol. 2. p. 50.
10. “Nem encantador, nem quem consulte um espírito adivinhador, nem mágico, nem quem consulte os mortos;” (Deuteronômio 18:11 | ACF)
Ótimo artigo sobre crítica textual em defesa do TR.
Uma benção 🔥