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Os Arnaldistas e suas crenças


Crédito da imagem: Heberth Ventura



Nascido por volta de 1100 em Brescia, Itália, Arnaldo veio de uma família nobre. Desde a adolescência, demonstrava notáveis talentos e uma profunda sensibilidade moral, características que o acompanharam ao longo de sua vida. Ainda jovem, partiu para Paris, onde estudou teologia sob a orientação de Pedro Abelardo (1079-1142), um dos maiores intelectuais de sua época, e possivelmente também direito.


Além de receber uma das melhores formações da Europa, Arnaldo destacou-se como aluno brilhante diante de seu renomado mestre. Durante sua juventude, dedicou-se à leitura dos escritores latinos, ao estudo das artes liberais e ao aprofundamento no Trivium, demonstrando grande diligência acadêmica. Embora tenha sido influenciado por Abelardo, não foi a filosofia especulativa que moldou sua vida. Sua verdadeira transformação veio das Escrituras, que passaram a definir sua visão de mundo, seu conceito de sociedade e Estado, sua vida cívica e, sobretudo, seu compromisso em viver em conformidade com os ensinamentos de Cristo e de seus apóstolos.


Ao retornar para Brescia, Arnaldo tornou-se cônego agostiniano e, já em sua maturidade, possivelmente exerceu a função de reitor do mosteiro de San Pietro, fundado em 1096. Guiado e influenciado pelas Escrituras, teve contato com os valdenses em sua região, o que fortaleceu ainda mais seu anseio pelo retorno ao ideal apostólico de Igreja.


Com discernimento sobre seu tempo e a condição espiritual do povo e da Igreja, assumiu um papel de arauto evangelístico em sua cidade. Arnaldo possuía o espírito de um reformador e a determinação de um general. Conforme John McClintock e James Strong, ele foi como um Savonarola ou um Lutero de sua época. C.H. Spurgeon o descreveu como um pregador de praça pública e um destemido denunciante das usurpações papais. Além disso, destacava-se como um erudito intrépido, dotado de profunda sensibilidade espiritual.


Com a mensagem do Evangelho nos lábios e o clamor por liberdade religiosa, Arnaldo impactou profundamente o norte da Itália. Sua pregação insistia no retorno às implicações radicais do ensino primitivo, denunciando a vida efeminada e promíscua do clero e dos mosteiros. Em sua figura se cristalizou o protesto contra a secularização da Igreja e o poder temporal dos papas e líderes eclesiásticos.


Arnaldo exigia que os bispos renunciassem ao apego às riquezas e abraçassem a simplicidade evangélica, o que, em última instância, significava o abandono da Igreja de Roma. Seu impacto foi tão profundo que, no Segundo Concílio de Latrão (1139), o Papa Inocêncio II condenou tanto ele quanto Pedro de Bruys ao silêncio perpétuo e ao exílio da Itália. Entre as razões dessa condenação estava sua rejeição ao batismo infantil.


Durante esse período, enfrentou amarga hostilidade e perseguição de Bernardo de Claraval, que o via como um inimigo da Igreja. Por ordem papal, seus escritos foram queimados. Expulso da Itália, encontrou refúgio em Zurique, na Suíça, onde permaneceu por dez anos. No entanto, assim como aconteceria mais tarde com Lutero, enquanto Arnaldo vivia no cantão suíço, seus ensinos continuavam a sacudir Roma e a desafiar as estruturas religiosas da Europa.


Enquanto estava na Suíça, Arnaldo foi novamente perseguido por influência de Bernardo de Claraval, que conseguiu sua expulsão daquela região. No entanto, em vez de se intimidar, ele demonstrou a ousadia característica de seu espírito reformador e dirigiu-se diretamente à sede do Vaticano. Ali, ergueu com firmeza a bandeira da reforma religiosa no coração da cidade imperial.


Sua mensagem impactou profundamente o povo, despertando a consciência sobre a necessidade urgente de impor limites à autoridade clerical, que acumulava também poder secular. Com grande diligência, Arnaldo utilizou a lógica e sua capacidade argumentativa para defender a separação entre Igreja e Estado. Seu sucesso foi tão evidente que abalou dois papas, obrigando-os a peregrinar pelas cidades vizinhas como exilados, temerosos da influência crescente de sua pregação.


No entanto, um aspecto crucial precisa ser ressaltado. Ao proclamar uma mensagem que confrontava o papado e denunciava os abusos clericais, Arnaldo atraiu seguidores que, inflamados pelo desejo de mudança, buscaram derrubar o papa e o clero por meio da violência. Embora alguns tenham se aproveitado do impacto de sua pregação para promover ações extremistas, não há evidências concretas de que Arnaldo tenha incentivado o uso da força.


Sua pregação era ousada e confrontativa, mas jamais violenta. Deve-se lembrar que por muito tempo o povo esteve subjugado por um sistema tirânico disfarçado de cristianismo, e, ao despertar para a verdade, era quase impossível conter os ânimos exaltados. Para dissipar qualquer dúvida sobre sua posição, historiadores como David C. Haynes enfatizam que a espada (violência) não fazia parte de sua fé.


Esse grande e piedoso líder anabatista foi um homem à frente de seu tempo, antecipando verdades que seriam mais amplamente enfatizadas posteriormente. Fundamentado nos princípios bíblicos, sua visão sobre a Igreja e o Estado o levou a proclamar, como exigência essencial, a separação entre os poderes espirituais e temporais. Para ele, o governo secular não deveria estar subordinado à Igreja, nem a Igreja deveria exercer domínio sobre os assuntos civis.


Sua convicção estava solidamente ancorada nas palavras de Cristo em Marcos 12:17: "Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus." Essa passagem evidencia que o Estado, representado por César, não tem o direito de reivindicar tudo para si. Fomos criados à imagem de Deus, não à imagem de César. O poder temporal pertencia ao governo, mas a missão e o propósito da Igreja eram de outra ordem.


Sua mensagem não apenas defendia a separação entre Igreja e Estado, mas também reforçava a importância da liberdade de crença e de expressão. Ele compreendia que fé e coerção eram incompatíveis e que a verdadeira adoração a Deus só poderia ser fruto de uma consciência livre.


Em 1155, por ordem de Frederico I (1122-1190), conhecido como Barbarossa, Arnaldo foi preso em Roma, condenado à fogueira e, após sua execução, teve suas cinzas lançadas no rio Tibre. Martirizado por suas convicções, enfrentou seu destino com graça e firmeza.


Philip D. Johnson destaca o impacto duradouro de sua vida e morte, afirmando: “A vida e a morte de Arnaldo indicaram para as gerações futuras a profundidade de seu compromisso com um Cristianismo mais puro, livre dos emaranhados Igreja-Estado que perturbaram a civilização desde a Idade Média até nossos dias.”







Heberth Ventura



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Referências



HAYNES, David C. The Baptist Denomination: Its History, Doctrines, and Ordinances. New York: Sheldon, Blakeman & Company, 1856 .


JOHNSON, Phillip D. Arnold of Brescia: Apostle of Liberty in Twelfth-Century Europe. United States: Wipf & Stock Publishers, 2016.


MCCLINTOCK,  John; STRONG , James. Cyclopaedia of Biblical, theological, and ecclesiastical literature. New York: Harper, v. 1, 1880.


SPURGEON, Charles H. Lições aos meus alunos: Homilética e teologia pastoral. São Paulo: PES, v. 1, 2014.

1 Comment


Wagner da Silva Lopes
Wagner da Silva Lopes
Mar 26

Arnaldo, outro servo de Deus que conheceu o verdadeiro evangelho por meio da palavra do Deus vivo. Este herói da fé pregou a verdade de Deus até as últimas consequência combatendo as atrocidades que catolicialsmo romano fazia e por seu dezejo de conduzir a igreja de volta ao evangelho apostólico. Louvado seja Deus por homens fiéis como foi Arnaldo.

Deus é fiel.

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