Gilbert Meilaender, autor de um clássico “evangélico” sobre bioética, destaca o valor da vida humana e se opõe em regra ao aborto. Ele, porém, cria exceções ao direito à vida da criança no ventre materno que o põe em contradição consigo mesmo e torna frágil a sua própria tese.
Meilaender reconhece que os anabatistas (mais coerentes que ele) são contra o aborto de forma absoluta, o que não corresponde a sua posição:
“Para os CRISTÃOS PACIFISTAS, a resposta a essa pergunta decorrerá de uma oposição mais generalizada ao extermínio da vida humana. Sua oposição ao aborto brotará do simples fato de que se empenham para dar guarida à vida humana, nunca matá-la. quanto ao restante de nós, porém, creio que há algumas circunstâncias –muito restritas – em que não devemos negar á mulher o direito ao aborto se assim for seu desejo.”[1]
Para Meilander, se a gravidez for uma ameaça à vida da mãe, de modo que ou a mãe ou a criança deva morrer, a mãe pode realizar o aborto. Apesar de liberar a mãe para cometer esse pecado, Meilander dá indicativos de que sabe qual seria o verdadeiro comportamento cristão:
“É possível que ela esteja disposta a assumir o risco por causada criança, levando até o fim a vocação para o discipulado, isto é, a vocação de ser o que cristo seria para esse próximo a quem ela se vê tão intimamente ligada. Podemos admirar sua decisão, podemos tentar imitá-la do mesmo jeito que ela tenta imitar a cristo, mas não podemos afirmar que essa seja a única maneira de agir como um cristão.”
Meilander parece sugerir que imitar a Cristo é apenas uma opção para o cristão. A Bíblia, porém, ensina que DEVEMOS obedecer a Cristo e imitá-lo no caso específico de morrer pelo próximo (I João 3: 16; 2:6). O novo mandamento de Cristo estabelece que devemos amar como ele amou.
Meilander também admite a possibilidade “lícita” do aborto quando a gravidez resultar de estupro ou de relação incestuosa:
“Deveríamos, penso eu, agir de modo semelhante nos casos – muito raros também – de gravidez resultante de relação forçada ou incestuosa.”[2]
Veja que a expressão “penso eu” revela a insegurança do autor. Ele reconhece que “a vida da mulher não é ameaçada por esse tipo de gravidez”, mas, ainda assim, defende o aborto.
Nós entendemos que a mulher estuprada deve ser auxiliada por irmãos que devem criar seu filho se ela não tiver condições psicológicas para isso. O aborto, porém, nunca deve acontecer. O inocente não deve pagar pelo culpado (Ezequiel 18: 1-4, 20).
Meilander reconhece que o feto é, “do ponto de vista formal, INDUBITAVELMENTE INOCENTE”, mas não o poupa de modo algum. As suas palavras, porém, deixam escapar qual seria a conduta verdadeiramente cristã:
“É claro que é possível que ela (a mãe) encontre coragem e forças para preservar e amar até mesmo aquele cuja presença encarna o inimigo. Todavia, reiteramos que não se pode afirmar que essa seja a única maneira de seguir a Cristo.”[3]
Meilander não justifica com nenhum argumento a sua admissão do aborto decorrente de relação incestuosa. As suas palavras sugerem que seguir a Cristo seja uma opção, acomodando a ética cristã ao homem egoísta e ressentido.
Quanto o assunto é bioética, recorro a coerência e biblicidade dos anabatistas. Com respeito a autores de outras crenças, eu francamente acho os católicos mais coerentes nesse tema que a maioria dos “evangélicos”!
Pastor Glauco Barreira M. Filho (30.04.2010)
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[1] MEILANDER, Gilbert. Bioética: Uma perspectiva cristã. Trad. Antivan Guimarães Mendes, Lena Aranha, Lucy Yamakami. 2a ed. São Paulo: Vida Nova, 2009, p. 52-53
[2] Op. Cit., p. 53
[3] Op. Cit., p. 54
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