Crédito da imagem: Warley Frota
O anabatismo do século XVI começou em 1525 em Zurique, na Suíça, do qual saíram igrejas de fiéis separadas da igreja oficial daquele tempo. Michael Sattler era um ex-monge católico que se uniu ao movimento anabatista e sofreu martírio em 1527. Acredita-se que Acordo Fraternal Entre Alguns Filhos de Deus em Sete Artigos (também chamado de A Confissão Schleitheim de Fé, tirando seu nome da vila na qual foi adotado) tenha sido escrito por Michael Sattler. Esta declaração de fé preencheu um papel crucial na unificação de anabatistas dispersos em suas crenças bíblicas durante o tempo de perseguições severas. Também serviu de testemunho de suas crenças para outros que não faziam parte de suas igrejas.
A Confissão de Fé de Schleitheim
Um acordo fraternal entre alguns filhos de Deus em sete artigos
24 fevereiro 1527
Os artigos que discutimos e sobre os quais todos concordamos são estes: I) o batismo, II) o banimento (exclusão), III) o partir do pão, IV) a separação das abominações, V) os pastores na igreja, VI) a espada, e VII) o juramento.
I. Observações sobre o batismo: O batismo será aplicado em todos os que aprenderam [a necessidade] do arrependimento e da regeneração de vida e verdadeiramente acreditam que seus pecados foram levados por Jesus Cristo, que desejam ser sepultados com ele na morte, para que possam ser ressuscitados com ele, e em todos aqueles que neste sentido pedem (o batismo) de nós e o exigem para si. Isto exclui todo batismo de infantes, a maior e principal abominação do papa. Nisto você tem o alicerce e o testemunho dos apóstolos. Leia Mateus cap. 28; Marcos cap. 16; Atos caps. 2, 8, 16, 19. Isto nós queremos guardar com simplicidade, e ao mesmo tempo com firmeza e segurança.
II. Nós concordamos o seguinte sobre a exclusão. A exclusão será utilizada em todos os que se entregaram ao Senhor para andar em seus mandamentos e com todos os que foram batizados no corpo único de Cristo e que são chamados de irmãos, e no entanto às vezes escorregam e caem no erro e no pecado, sendo inadvertidamente derrotados. Os mesmos serão admoestados duas vezes em segredo e na terceira vez abertamente disciplinados ou banidos de acordo com o mandamento de Cristo. (leia Mateus cap. 18). Mas isto será feito de acordo com a direção do Espírito (leia Mateus cap. 5) antes do repartir do pão, para que possamos repartir e comer o pão com um pensamento e em amor, e para que possamos beber de um [só] cálice.
III. No repartir do pão temos um só pensamento e concordamos (como segue): Todos aqueles que desejam repartir o pão em lembrança do corpo quebrantado de Cristo e os que desejam beber de um cálice em lembrança do sangue derramado de Cristo, serão unidos primeiro pelo batismo no corpo único de Cristo, que é a igreja de Deus, cujo Cabeça é Cristo. Pois como Paulo nos mostra, não podemos ao mesmo tempo beber do cálice do Senhor e do cálice do diabo. Isto é, todos os que têm comunhão com as obras mortas das trevas não participam da luz. Portanto todos os que seguem o diabo e o mundo não têm parte com os que são chamados por Deus para sair do mundo. Todos os que jazem no mal não têm parte no que é bom. Portanto, é (assim) e precisa ser (assim): Qualquer um que não foi chamado por Deus para uma só fé, para um só batismo, para um só Espírito, para um corpo, com todos os filhos da igreja de Deus, não pode ser formado (em) um pão com eles, como de fato precisa ser feito se for para repartir o pão em verdade de acordo com o mandamento de Cristo.
IV. Nós concordamos (como segue) sobre a separação: Será feita uma separação do mal e da impiedade que o diabo semeou no mundo, sendo por isso que simplesmente não teremos nenhuma comunhão com eles (os ímpios) e não andaremos com eles na multidão de suas abominações. É assim: sendo que todos que não andam em obediência de fé e não se uniram a Deus, de modo que não desejam fazer a sua vontade, [estes] são uma grande abominação perante Deus, não sendo possível que coisa alguma cresça, ou seja produzida por eles, a não ser coisas abomináveis. Porque verdadeiramente todas as criaturas pertencem a um de dois grupos, dos bons ou dos maus, dos crédulos ou dos incrédulos, das trevas ou da luz, do mundo ou dos que saíram do mundo, do templo de Deus ou dos ídolos, de Cristo ou de Belial, e nenhum pode se associar com o outro. Para nós então o mandamento do Senhor é claro quando ele chama para nos separarmos do mal e assim ele será o nosso Deus e nós seremos seus filhos e suas filhas. Ele nos admoesta a nos afastar da Babilônia e do Egito terreno para que não sejamos participantes da dor e do sofrimento que o Senhor infligirá neles. Disso devemos aprender que tudo que não é unido com nosso Deus e Cristo forçosamente é uma abominação que precisamos evitar e do qual temos que fugir. Isto significa todas as obras de católicos e protestantes, cultos, reuniões e presença na igreja, casas de bebidas, assuntos cívicos, juramentos feitos na incredulidade e outras coisas semelhantes que são altamente estimadas pelo mundo e no entanto são praticadas em uma contradição total ao mandamento de Deus, de acordo com a injustiça que há no mundo. Precisamos nos manter separados de todas estas coisas e não ter nenhuma participação, pois não são nada a não ser abominação, sendo o motivo por que somos odiados [por servirmos] a Cristo Jesus, o qual nos libertou da escravidão da carne e nos adequou ao serviço de Deus através do Espírito que ele nos deu. Portanto, sem dúvida ficaremos sem as armas não cristãs e diabólicas de força — tais como a espada, a armadura e coisas semelhantes, e seu uso (em favor) dos amigos ou contra os nossos inimigos. Pela virtude da Palavra de Cristo, não resistais [àquele que é] mal.
V. Nós estamos de acordo, como segue, sobre pastores na igreja de Deus. O pastor da igreja de Deus será como prescrito por Paulo, alguém que tem bom testemunho por aqueles que não são da fé. Este ofício tem a finalidade de ler, de admoestar e ensinar, de advertir, de disciplinar na igreja, de dirigir as orações para o progresso de todos os irmãos, de levantar o pão ao ser repartido e em todas as coisas cuidar do corpo de Cristo, para que seja edificado e desenvolvido, e que a boca do caluniador seja tapada. [O pastor], além do mais, será apoiado pela igreja que o escolheu, naquilo que tiver necessidade, para que aquele que ministra o Evangelho possa viver do Evangelho, assim como o Senhor tem ordenado. Mas se o pastor fizer alguma coisa que exige disciplina, [seu caso] não será tratado a não ser (com o testemunho) de duas ou três testemunhas. E quando pecam serão disciplinados na presença de todos para que os outros temam. Mas se ocorrer que pela cruz este pastor seja excluído ou levado para o Senhor (pelo martírio) outro será ordenado no seu lugar na mesma hora para que o pequeno rebanho do Senhor e o povo não sejam destruídos.
VI. Nós estamos de acordo como segue sobre a espada. A espada é ordenada por Deus fora da perfeição de Cristo. Ela castiga e mata os ímpios, e guarda e protege os bons. Sob a Lei, a espada foi ordenada para o castigo e a morte dos ímpios, a mesma (espada) está ordenada (agora) para ser utilizada pelos magistrados deste mundo. Na perfeição de Cristo, no entanto, somente o banimento é usado para a advertência e a exclusão daquele que pecou, sem mortificar a carne — simplesmente a advertência e a ordem de não pecar mais. Agora, muitos que não reconhecem (isto como sendo) a vontade de Deus perguntarão se o cristão pode ou não pode utilizar a espada contra os ímpios para a defesa e proteção dos justos, ou por causa do amor. Nossa resposta unânime é como segue: Cristo nos ensina e ordena que aprendamos dele, pois ele é manso e humilde de coração e encontraremos descanso para as nossas almas. Também Cristo disse à mulher pagã que foi flagrada em adultério, não que devesse ser apedrejada conforme a lei de seu Pai (e no entanto ele diz, Como o Pai me ordenou, assim eu faço), mas com misericórdia e perdão a advertiu que não pecasse mais. Tal (atitude) devemos aceitar completamente segundo a regra do banimento. Segundo, será perguntado sobre a espada, se o cristão deve fazer julgamento em contendas e conflitos mundanos, do tipo como os incrédulos têm entre si. Cristo não queria julgar entre irmão e irmão no caso de uma herança, mas se recusou a fazer isso. Portanto, devemos fazer o mesmo. Terceiro, será perguntado quanto à espada, [o cristão] pode ser magistrado se for escolhido para isso? A resposta é como segue: Eles quiseram tornar Cristo [seu] rei, mas ele fugiu e não entendeu isto como sendo a vontade do seu Pai. Assim, nós devemos fazer como ele fez, e segui-lo, e assim não andaremos em trevas. Pois ele mesmo diz que quem quiser vir após mim, tome sua cruz e siga -me. Também, ele mesmo proíbe a (utilização de) força da espada, dizendo, Os príncipes deste mundo dominam sobre eles, etc., mas não será assim com vocês. Paulo também diz que os que Deus dantes conheceu também os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho, etc. Também Pedro diz que, Cristo padeceu por nós (não nos dominou) e nos deixou exemplo para que sigamos em suas pisadas. Finalmente observa-se que não é apropriado que o cristão sirva de magistrado por causa destes detalhes. O magistrado do governo age segundo a carne, mas o cristão segundo o Espírito; suas casas e moradias permanecem neste mundo, mas as dos cristãos estão no céu; sua cidadania está no mundo, mas a cidadania dos cristãos está no céu; as armas de seus conflitos e guerra são carnais e contra a carne somente, mas as armas dos cristãos são espirituais, contra as fortificações do diabo. Os mundanos estão armados com aço e ferro, mas os cristãos estão armados com a armadura de Deus, com verdade, justiça, paz, fé, salvação e a Palavra de Deus. Resumindo, como a mente de Deus para conosco, assim será a mente dos membros do corpo de Cristo através dele em todas as coisas, para que não haja divisões no corpo que o possam destruir. Pois todo reino dividido contra si será destruído. Agora sendo que Cristo é tudo que foi escrito a seu respeito, seus membros precisam ser a mesma coisa, para que seu corpo possa permanecer inteiro e unido para assim progredir e ser edificado.
VII. Estamos de acordo no seguinte, sobre o juramento. O juramento é uma confirmação entre aqueles que brigam ou fazem promessas. Sob a Lei era ordenado que fosse feito no nome de Deus, mas somente em verdade, nunca em falsidade. Cristo, que também ensina a perfeição da Lei, proíbe todo juramento entre seus (seguidores), seja verdadeiro ou falso — não pelo céu, nem pela terra, nem por Jerusalém, nem por nossa cabeça — e isto pelo motivo que ele dá logo depois. Porque você não é capaz de tornar um cabelo branco nem preto. Assim dá para você ver que é por este motivo que todos os juramentos são proibidos; não podemos cumprir aquilo que prometemos, mesmo quando juramos, pois não podemos mudar (nem) as coisas mínimas em nós. Agora há aqueles que não dão credibilidade às simples ordens de Deus, mas contestam esta questão. Pois bem, Deus não jurou a Abraão por si mesmo (sendo que ele era Deus) quando prometeu-lhe que estaria com ele e que seria seu Deus se ele guardasse seus mandamentos — por que então eu não posso jurar quando faço uma promessa a alguém? Resposta: Ouça o que as Escrituras dizem: Deus, desde que desejou mostrar mais abundantemente aos herdeiros a imutabilidade de seus conselhos, inseriu um juramento, que por duas coisas imutáveis (em que é impossível que Deus minta) tenhamos uma forte consolação. Observe o significado desta escritura. O que Deus proíbe que você faça, ele tem poder para fazer, pois tudo é possível para ele. Deus fez um juramento a Abraão, dizem as Escrituras, para que pudesse mostrar que seus conselhos são imutáveis. Isto é, ninguém é capaz de resistir ou frustrar sua vontade; portanto ele é capaz de cumprir seu juramento. Mas nós não podemos fazer nada, como Cristo já disse, para guardar ou cumprir (nossos juramentos); portanto não devemos nunca jurar (nichts schweren). Então outros dizem como segue: Não é proibido que Deus jure no Novo Testamento, quando na realidade é ordenado no Antigo, mas é proibido jurar apenas pelo céu, a terra, Jerusalém e a nossa cabeça. Resposta: Ouça as Escrituras, aquele que jura pelo céu jura pelo trono de Deus e por ele que está sentado nele. Observe; que é proibido jurar pelo céu, que é apenas o trono de Deus; Quanto mais é proibido (jurar) pelo próprio Deus! Tolos e cegos, o que é maior, o trono ou ele que está sentado nele? Ouros dizem, Sendo que o mal agora (está no mundo, e) sendo que o homem precisa de Deus para (estabelecer) a verdade, assim os apóstolos Pedro e Paulo também juravam. Resposta: Pedro e Paulo apenas deram testemunho daquilo que Deus prometeu a Abraão sob juramento. Eles mesmos não prometem nada, como o exemplo indica claramente. Dar testemunho e jurar são duas coisas diferentes. Pois quando a pessoa jura ele está, em primeiro lugar, prometendo coisas futuras, como Cristo foi prometido a Abraão, o qual nós recebemos muito tempo depois. Mas quando a pessoa dá testemunho sobre o presente, seja bom ou mau, como Simeão falou para Maria sobre Cristo e testificou: Eis que este (menino) é posto para queda e elevação de muitos em Israel, e para sinal que é contraditado. Cristo também nos ensinou da mesma forma quando disse, Seja, porém, o vosso falar: Sim, sim; Não, não; porque o que passa disto é de procedência maligna. Ele disse: Seu falar ou palavra será sim e não. (No entanto) quando alguém não quer compreender, ele se fecha para não entender o significado. Cristo é simplesmente Sim e Não, e todos os que o procuram simplesmente compreenderão a sua Palavra. Amém.
Retirado do livreto Michael Sattler: uma testemunha de Jesus Cristo. Primeira Edição, São Paulo – SP, LMS, 2012.
Muito bom saber que nossos irmãos acreditavam